Milton Neves: a favor da necropolítica de Bolsonaro
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Em 01/12/2020 o jornalista Rubens Valente publicou matéria na UOL em que noticia que uma empresa de comunicação elaborou um relatório para o governo federal que classificou 77 jornalistas e influenciadores em redes sociais entre “detratores”, “neutros informativos” e “favoráveis ao governo” a partir de análise de postagens do mês de maio de 2020 sobre o Ministério da Economia e sobre o ministro Paulo Guedes. Dentre as medidas sugeridas pelo relatório constam “esclarecimentos” e “monitoramentos preventivos” para os “detratores” e “neutros”, e “propor parceria para divulgar ações da pasta”, como a realização de lives, para os “favoráveis”.
Dentre os “detratores” foram citados 50 nomes, como os jornalistas Vera Magalhães e Xico Sá, além de acadêmicos como Silvio Almeida, Laura Carvalho e Jesse Souza. Foram citados oito “neutros informativos”, entre eles as jornalistas Cristina Lôbo e Mônica Bérgamo. Dos “favoráveis” ao governo federal foram listados 23 pessoas, entre elas Roger Rocha Moreira (A gente somos inútil), Rodrigo Constantino e o jornalista esportivo Milton Neves.
Silvio Almeida reagiu assim no Twitter: “Acabo de saber que meu nome foi incluído em um relatório produzido a mando do Ministério da Economia. Segundo a reportagem, estou na lista por ser crítico ao governo, um “detrator”. Minha grande preocupação agora é: em qual lugar do currículo Lattes devo colocar esta honraria?”.
E quanto ao Milton Neves? Essa semana em seu Twitter, além de anúncios de produtos, Neves postou meme com o seguinte dizer: “Esquerdista é o cara que aprendeu a chamar seus desejos de direitos e o direito dos outros de abuso”; publicou vídeo que chama Guilherme Boulos, o candidato derrotado à prefeitura de São Paulo, de “vagabundo”; postou meme com o rosto de Boulos e o dizer: “sonhei que ia trabalhar”; compartilhou vídeo postado por outro favorável, o Roger, em que Alexandre Garcia, que também foi favorável aos governos da ditadura civil-militar, se coloca ao lado de Bolsonaro em sua guerra contra o governador de São Paulo, João Dória, e a “vacina chinesa”.
O infame relatório do governo federal descreveu assim Milton Neves: “Simpatizante do governo Bolsonaro, fez elogios ao ministro Paulo Guedes por conseguir injetar R$ 500 bilhões no Tesouro por meio de operação estruturada no câmbio. Em declaração, enfatizou desejo de que o ministro Paulo Guedes ficasse ao menos 15 anos trabalhando para o governo federal por seu conhecimento em economia.” O relatório sugere as seguintes ações com o jornalista: “Envio de matéria e projetos do Ministério da Economia e propor parceria para divulgar ações da Pasta.”
Mas o que representa esse “conhecimento de economia” de Paulo Guedes? Quais as consequências de seu conhecimento traduzido em ações governamentais para a população? Em novembro de 2019, ao comentar sobre os protestos populares em países como o Chile, Guedes, fazendo coro com Bolsonaro, ameaçou com um novo AI-5: “Não se assustem então se alguém pedir o AI-5. Já não aconteceu uma vez? Ou foi diferente? Levando o povo para a rua para quebrar tudo. Isso é estúpido, é burro, não está à altura da nossa tradição democrática”. No início de 2020 Guedes chamou os funcionários públicos de “parasitas”, reverberando o preconceito de senso comum que seriam todos vagabundos privilegiados, abrindo caminho para uma reforma administrativa. Antes disso ele havia dito que o dólar quando estava baixo era ruim, pois até empregadas domésticas estavam viajando à Disney. Lamentou também que pobre não poupa (consome tudo) e apenas o rico sabe capitalizar os recursos. Em 21/01/2020, no Fórum Econômico Mundial, em Davos, ele atribuiu aos pobres as agressões ao meio ambiente. E mais recentemente, além da aprovação da Reforma da Previdência, ele propôs o congelamento por dois anos dos reajustes de aposentadorias, pensões e auxílios para liberar recursos do Orçamento e garantir o pagamento mensal de R$ 300,00 aos beneficiários do Renda Brasil.
Ou seja, o que para Milton Neves significa “conhecimento de economia” de Paulo Guedes, para o grosso da população significa medidas econômicas anti-povo, contra o povo. Neves é um jornalista muito influente e bem sucedido, com espaço constante em programas de tevê, rádio, colunas em periódicos, etc. É mais um daqueles jornalistas ricos que, de seus confortáveis apartamentos com ar-condicionado, se dirigem a todos os torcedores de futebol. Seu “sucesso” se deve à audiência dos programas esportivos, formada por muitos torcedores pobres e marginalizados, para quem ele, no fundo, não dá a mínima, apesar de depender da audiência deles.
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Antropólogo, documentarista, socialista, comediante amador e são-paulino da Vila Sônia.
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Tenho acompanhado os colunas do Alexandre e elas são muito estimulantes para pensar esta relação delciada, tradicional e tensa entre futebol e política. Além disso, o colunista esbanja domínio da língua pátria e adiciona ainda leveza e ironias sagazes. (“Roger A gente Somos Inútil” é ótima! Já imaginei o Roger falando isto para o Miltom Neves…rss.). Parabéns ao colunista e ao site por incorporar autores com este perfil habilidoso de camisa 10.
Muito obrigado pelas palavras de incentivo tanto ao autor quanto ao Atrás do Gol, Luís Roberto!